O romance Caim, de José Saramago, é uma espécie de odisseia em que o herói Caim (Caim/José Saramago) se defronta sucessivamente com aventuras/histórias bíblicas, integrando-se nelas ou observando-as, vivendo-as, por vezes, intensamente.
O herói viaja pelo tempo, a pé ou montado num burro, chegando ao presente de cada história no momento preciso em que, por decisão divina, se preparam as grandes tragédias, castigos ou provações, que constituem os episódios do Antigo testamento: salva Jacob de ser morto pelo pai, Abraão, a mandado de Deus e para experimentar a sua fé; testemunha a destruição de Sodoma, verificando com os seus olhos os «desvios» sexuais que levaram deus a decidir a punição; observa a confusão na torre de babel, aguarda no sopé do monte Sinai pelo demorado encontro de Moisés com o senhor e assiste à adoração do borrego de ouro e à cruel mortantade dos vizinhos e amigos dos hebreus ordenada pelo mesmo senhor; está presente na destruição implacável de Jericó pelo exército israelita comandado por Josué; serve Job e presencia as desgraças de que é vítima; entra na arca de Noé com o seu burro e ajuda na sua construção.
Caim/José Saramago reage de forma critica e revoltada às injustiças que observa, com um olhar humano que considero intemporal.
Caim, qual Ulisses, deixa-se seduzir pela «feiticeira» Lilith e esses capítulos são verdadeiramente sedutores e cheios de autenticidade.
A odisseia de Caim é originada por um crime. Caim matou Abel, seu irmão mais novo, porque deus preferia os cordeiritos que este guardava e lhe oferecia às espigas e às sementes do seu trabalho agrícola. O sangue de Abel nunca mais largou Caim que foi marcado na testa por deus e destinado a errar pelo mundo para se redimir do seu pecado. (Porque é que me lembrei tantas vezes da obra Pequenas Memórias, de José Saramago e da morte na infância do irmão do autor?)
Caim acaba por enfrentar deus e por castigá-lo, matando toda a família de Noé, impedindo a reprodução e acabando assim com a humanidade, obra divina, criada para sofrer todas as perversões de deus.
Será que José Saramago, próximo da morte, quer que a humanidade acabe com ele. Isto também não é pouco perverso!
Mas que o romance é muito engraçado, isso é uma verdade!
Olá,
ResponderEliminarTens um errinho no texto de Caim: presencia e não precencia. És uma ensaísta, pá!
O Anjo Dourado
Já o cacei, Anjo Dourado, ainda bem que estavas à porta deste paraíso.
ResponderEliminargostei muito do texto sobre Caim. é uma boa síntese, acho. Ainda não li o livro, mas este texto estimula-me a lê-lo, com maior urgência.
ResponderEliminaragradeço à Georgina e peço-lhe notícias de outras leituras.
MCN
MCN, agradeço o comentário positivo. Claro que outros posts se seguirão, sobre leituras ou não. Bjs
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