segunda-feira, 30 de novembro de 2009

«Tetro»,de Coppola, e a saturação do génio



  Em Tetro, de Francis Ford Coppola, o jogo está no lugar do génio numa família. Isto é, numa família em que existe um génio, neste caso um grande compositor e músico, os restantes membros da família que possuam elevados talentos poderão ter a sua carreira ameaçada. O génio já consagrado segue o seu caminho altaneiramente, sem escrúpulos de prejudicar a vida dos seus familiares, ainda que sejam filhos, de lhes roubar as namoradas se for esse o seu desejo prioritário e imediato, e, sobretudo, sempre com grandes desconfianças em relação ao valor artístico ou intelectual desses mesmos familiares.
  Assim, o primogénito da família, cuja vocação literária se manifestou desde cedo, vítima de um pai genial egoísta e egocêntrico, rejeita a família, rejeita a escrita e torna-se um bicho intratável, ora autista ora brutal, descoberto num asilo de doentes mentais por uma psicóloga que por ele se apaixona.
  Os conflitos deste estranho ser com o meio-irmão Benjamim que se lhe introduz em casa contra a sua vontade, tornam-se a linha central do filme. Benjamim nutre uma extrema admiração por Tetro, aliás Angelo. Traz consigo uma velha carta em que Angelo promete nunca o abandonar. Mas Tetro repudia qualquer contacto com a família, mesmo com este encantador irmão. É a mulher de Tetro que o acolhe, lhe explica as absurdas reacções do irmão e lhe dá os manuscritos guardados há muito numa mala e, voluntariamente, sempre inacabados.
 A Benjamim cabe a tarefa de acabar a obra de Tetro, de apresentá-la no Festival da Patagónia (festival que só pelo enquadramento paisagístico vale a pena ser visto) e torná-la uma obra reconhecida e premiada.
  A tragédia, no entanto, está escondida. Tetro desvenda a Benjamim a verdadeira paternidade deste. Ele, Tetro, é, de facto, o pai de Benjamim. O velho Tetroccini seduzira-lhe a namorada, já grávida, obviamente. E o ódio pelo velho compositor agora moribundo transforma-se num ódio familiar.
    Tetro é um bom filme. E ainda que o fantasma do génio possa saturar um pouco, o tema não está gasto. Tem ainda um importante lugar! 

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Uma pintura de Evelina Oliveira



  Na Arte Lisboa 2009, galeria São Mamede, estavam expostos vários quadros de Evelina Oliveira. Um deles, este, vira-o eu já em finais de Setembro, uma tarde em que caminhava pela rua da Escola Politécnica. 
 Nessa tarde, lembro-me que entrei na galeria, seduzida pelo quadro, e perguntei quem era o autor. Foi então que fiquei a saber da existência de Evelina Oliveira. Não conhecia. No entanto, faz exposições desde 1994. É ilustradora. Teve, recentemente, uma exposição, no Porto, intitulada Paisagens de mim.
  Rocha de Sousa, num artigo que escreveu para o Jornal Letras (6 de Outubro de 2009) sobre a pintura de Evelina Oliveira, com o título Sonhar com os olhos de Alice, diz: «Deformação do visível para que tudo seja menos complexo e opaco como acontece no nosso espaço urbano, carregado de ruídos».
  Deve ter sido esta beleza e delicadeza que se distancia  do rude e grotesco espaço urbano que me atraiu. E me levou a comprar o quadro.
  

domingo, 22 de novembro de 2009

O filme «Julie e Júlia» e a obsessão do blogue



 O filme Julie e Júlia, de Nora Ephron, é uma comédia «simpática» com as actrizes Meryl Streep e Amy Adams.
  Em 1949, Julie Child chega a Paris com o marido, um diplomata americano que exibia, no dedo máximo ou impúdico, um anel com uma enorme pedra turquesa, e começa a aprender a confeccionar receitas da cozinha francesa. O marido elogia-lhe os cozinhados e encoraja-a  a prosseguir esta ocupação. Julie, com um estranho sotaque nasalado, associa-se a outras americanas a viver em Paris e, juntas, dedicam-se de forma entusiástica à cozinha francesa. Mais tarde, já nos E.U.A., Julie é convidada por uma editora para publicar um livro: Dominando a arte da cozinha francesa.
  É este livro e uma admiração esquisita pela autora («a sua amiga imaginária») que, cinquenta anos depois, leva Júlia, uma novaiorquina de trinta anos, a criar um blogue de cozinha, The Julia/Julia project, que se propõe em 365 dias relatar a experimentação de todas as receitas publicadas pela Child. A obsessão torna-se quase insuportável para Júlia, para o quase sempre paciente marido e para nós, expectadores. A sequência - experimentação culinária/relato no blogue - é um frenesim histérico que adverte para  a insanidade mental  a que esta interessante actividade de manter blogues pode conduzir. A frustração pela ausência de comentários e, posteriormente, a euforia pelo excesso dos mesmos e o sucesso público (jornalistas e também edição de livro) deixaram-me a vomitar blogues.
  Aliás, com tanta comida a entrar-nos pelos olhos dentro do princípio ao fim do filme - la grande-bouffe - o vómito vem a condizer. As Júlias confessam: «Só penso em comida o dia inteiro!». E o elogio da manteiga, direi eu, não será o melhor para a obesidade mórbida que para aí grassa.
  Enfim, um filme dispensável! E nada como criar blogues sobre comida e sexo para se ter sucesso...

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Desocultando a face


Todos todos embuçados
todos todos mascarados
os Godinhos engordando aos golinhos
os Penedos inchando sem medos
os Varas arrecadando de caras
os Valentins enchendo os bolsos de amendoins
os Costas espalhando mais bostas
os Cunhas cravando as unhas
todos todos sem esquecer os Contradanças
neste brando país enchem as panças

 Nota silogística: Ou a justiça em Portugal é um buraco negro, ou os corruptos em Portugal conhecem o segredo do Homem Invisível. 

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

O deus google



  O google é o deus dos nossos dias. Não se vai à igreja, abre-se o computador e vai-se ao google. O google é omnisciente, omnipresente e omnipotente.
  Parece sem fim e está sempre em expansão, como o deus-universo, o conhecimento que o google permite sobre todas as coisas (sites, blogues, wikipédias, etc.).
 Em todos os lugares do planeta, em qualquer parte do universo (satélites, naves e estações espaciais por enquanto), é possível aceder ao google, navegar por ele.
 O seu poder parece ilimitado. O amor, génese da vida, encontra-se nos chats e nos sites e blogues que promovem os encontros amorosos e os casamentos. A doença e a morte adiam-se e evitam-se através do google. Sobre todas as doenças, encontraremos informações e, sobre a morte, temos explicações, fotografias as mais chocantes, videos, etc, etc.. Quando a morte chega para os nossos amigos, há muitas vezes um blogue ou um jornal on line que nos avisa e que nos relata mesmo os pormenores da morte. Da nossa própria morte, também os nossos familiares  poderão tratar através do google.
  Devemos, realmente, veneração ao google. Aliás, qual deus que se preze, o google permite o livre arbítrio. O poder da escolha, da selecção entre o bom e o mau, entre o melhor e o pior.

 Por isso me pareceu excessivo o desprezo que o comentarista Pacheco Pereira manifestou, ontem, no programa Ponto Contraponto na sic notícias, pela internet e os seus sítios de informação. 

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Ministra da Educação ou a imagem da paz

(René Magritte)


   A ministra da educação apareceu de asas brancas, hoje, na Grande Entrevista da RTP1. Era a imagem da paz. A ministra sabe resolver tudo. Está em diálogo. Com os professores (quais?), com o Conselho de Escolas, com o Conselho Científico, com os sindicatos, ... Já na próxima semana, apresentará novas propostas para discussão nos órgãos próprios. A revisão do estatuto será global, porque se trata de uma estrutura. Compreendo. Não responde directamente ao fim da divisão da carreira em titulares e não titulares, mas talvez não fosse uma divisão que lhe agradasse.  No entanto,  nem todos chegarão ao fim da carreira. Por incompetência e negligência provadas? Aceito. (Não deve ser esquecida a base em que os actuais professores titulares foram seleccionados. Nem os professores com carreira reconhecida dentro e fora da escola que ficaram não titulares.)
 A avaliação será interna e externa? Também aceito. Os avaliadores receberão formação especializada? E, antes da receberem, terão já currículos adequados? Há muita gente nas E.S.E.S com muito saber acumulado à espera do aplicar? Espero que sim.
  Será valorizado o trabalho lectivo e também o restante trabalho na escola e ainda o trabalho realizado fora da escola? Parece-me bem.
   O horário dos professores vai ser alterado. Voltarão a ter tempo para estudar, ler, ter interesses culturais? Deixarão de ser autómatos/sinâmbulos, na escola de manhã à noite?
  A ministra da educação é apaziguadora. Tem um sorriso amplo. Os olhos bem abertos. E veste de branco.  
  Afirma a dignidade da profissão. Vai defender essa dignificação? É possível. Temos de esperar para ver e ver para crer. Os professores andam muito desconfiados depois de tudo o que lhes aconteceu nos últimos quatro anos.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Caim/José Saramago numa odisseia


   O romance Caim, de José Saramago, é uma espécie de odisseia em que o herói Caim (Caim/José Saramago) se defronta sucessivamente com aventuras/histórias bíblicas, integrando-se nelas ou observando-as, vivendo-as, por vezes, intensamente.
  O herói viaja pelo tempo, a pé ou montado num burro, chegando ao presente de cada história no momento preciso em que, por decisão divina, se preparam as grandes tragédias, castigos ou provações, que constituem os episódios do Antigo testamento: salva Jacob de ser morto pelo pai, Abraão, a mandado de Deus e para experimentar a sua fé; testemunha a destruição de Sodoma, verificando com os seus olhos os «desvios» sexuais que levaram deus a decidir a punição; observa a confusão na torre de babel, aguarda no sopé do monte Sinai pelo demorado encontro de Moisés com o senhor e assiste à adoração do borrego de ouro e à cruel mortantade dos vizinhos e amigos dos hebreus ordenada pelo mesmo senhor; está presente na destruição implacável de Jericó pelo exército israelita comandado por Josué; serve Job e presencia as desgraças de que é vítima; entra na arca de Noé com o seu burro e ajuda na sua construção.
  Caim/José Saramago reage de forma critica e revoltada às injustiças que observa, com um olhar humano que considero intemporal.
 Caim, qual Ulisses, deixa-se seduzir pela «feiticeira» Lilith e esses capítulos são verdadeiramente sedutores e cheios de autenticidade.
  A odisseia de Caim é originada por um crime. Caim matou Abel, seu irmão mais novo, porque deus preferia os cordeiritos que este guardava e lhe oferecia às espigas e  às sementes do seu trabalho agrícola. O sangue de Abel nunca mais largou Caim que foi marcado na testa por deus e destinado a errar pelo mundo  para se redimir do seu pecado. (Porque é que me lembrei tantas vezes da obra Pequenas Memórias, de José Saramago e da morte na infância do irmão do autor?)
  Caim acaba por enfrentar deus e por castigá-lo, matando toda a família de Noé, impedindo a reprodução e acabando assim com a humanidade, obra divina, criada para sofrer todas as perversões de deus.
  Será que José Saramago, próximo da morte, quer que a humanidade acabe com ele. Isto também não é pouco perverso!
   Mas que o romance é muito engraçado, isso é uma verdade!

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Lixos junto dos contentores de reciclagem, não!



   Quando é que esta gentalha de Lisboa que despeja o lixo mais imundo junto dos contentores de reciclagem começa a ser devidamente multada?
   Está a ver-se grande preocupação em reincentivar a emel para multar os carros estacionados na cidade, houve redefinição de zonas nos bairros, reapreciação da aplicação de multas para este efeito, etc., etc.... Mas nos lixos ninguém fala!
   Há restaurantes que despejam toda a espécie de latas de bebidas, garrafas, caixas, os mais variados dejectos na rua. Os contentores estão vazios, mas as criaturas, ou se calhar autómatos, não perdem tempo a meter lá dentro as embalagens. Deixam-nas jazendo no chão, espalhando-se a porcaria por todo o lado.
  Isto passa-se impunemente todos os dias! Não seria importante estabelecer um sistema de multas para estes actos que deveriam ser considerados infracções cívicas? E pagar a vigilantes para aplicar essas multas?
    Os contentores de reciclagem que deviam ser uma imagem de civilização, tornaram-se uma exemplar imagem terceiromundista!

domingo, 1 de novembro de 2009

Gripe A - Vacinas nas farmácias já!!



  Seis milhões de vacinas (três milhões a duplicar) chegam para vacinar todos os portugueses que o desejarem. Não há razão para as vacinas não irem para as farmácias e serem levadas tal como a vacina da gripe sazonal. Parece que a fome deu em fartura e agora será bom que não vão para o lixo!
 Os políticos já se vacinaram? Os médicos? Os enfermeiros? As grávidas? As pessoas com patologias respiratórias?
  Os comuns mortais  e se calhar mais mortais do que os outros estão à espera. À espera que não se continue indefinidamente no período de restrição e se ajustem as medidas à nova situação.
   Que não seja necessário morrer sentado à espera!...